sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Frio

Ela vinha sentindo um frio constante. Não que isso atrapalhasse, mas já era quase verão.
Vez em quando se pegava quieta, num canto, pensando em algo pra fazer que pudesse distrair, ou, pelo menos, não deixasse que as palavras ruins viessem à cabeça. Palavras que ela nem sabia se eram verdadeiras.
Não tinha considerado mal o que lhe disseram. Não tinha preconceitos, mas preferiria ter ouvido tudo aquilo por outras bocas.
Mas,muitas dessas outras bocas já começaram a tagarelar coisas também não muito interessantes.
Engraçado como as pessoas começaram a enxergá-la de um modo mais maduro. Parecia que sempre tinha sido uma criança, que brincava, não tinha responsabilidades e que quando saía arrumadinha na rua sempre recebia o comentário clichê: "Que lindinha! Já está virando uma mocinha, não?".
Acho que, por algumas vezes, ela chegou a responder mentalmente:" Não.".
Agora, com suas novas responsabilidades, tudo mudou. Ficou melhor, talvez, pior. Não dá pra saber. É uma mulher, logo, uma incógnita.
E, essa incógnita ajudou a trazer o frio pra dentro de si.
Suas dúvidas, erros, acertos, vontades, desejos e anseios começaram a vir à tona em sua cabeça e o frio a dominou. Não era motivo pra chorar, mas para começar um desespero. Era motivo pra parar e pensar no que todos os sentimentos, mesmo que ruins, estavam lhe proporcionando. Era motivo para se aceitar e continuar com a cara no muro.
Não dava pra viver pensando assim. Era arriscar e poder sair ganhando, ou nada. Sua vida começou a se resumir assim. Não em desafios, mas em sacrifícios calorosos para que o frio pudesse ir embora rápido.

sábado, 23 de outubro de 2010

A menina das folhas secas.

O sol batia em meu rosto, naquela alaranjada tarde de outono. Aliviado de poder estar indo dormir, este, despediu-se de mim com um maravilhoso crepúsculo.
Naquele dia eu ainda não tinha visto a “menina das folhas secas”.
Assim eu a chamava, pois além de se divertir com as folhas que caíam das árvores plantadas na colina, eu não sabia seu nome.
Lembro-me dos seus gritinhos de alegria e dos cabelos castanhos, bem lisos, que passavam pelo seu rosto quando corria contra o vento.
Achei que já estava tarde e que deveria ir embora, pois a “menina das folhas secas”, não viria.
Era costume meu, ir todas as manhãs, comprar frutas e legumes frescos, afinal, papai já não era tão novo e precisava se cuidar.
Mais uma vez, o sol estava radiante. Um dos motivos para que eu voltasse à colina e visse novamente aquele entardecer cativante.
Quando cheguei em casa, vi papai se arrumando e logo estranhei.
-Bom dia, Giuseppe!
-Bom dia, querida. Já comprou as frutas e os legumes?
-Sim, papai, mas aonde o senhor vai?
-Visitar o túmulo de sua mãe.
Eu levei um susto, pois meu pai não visitava o túmulo da mamãe havia mais de um mês.
-O que deu no senhor?-perguntei.
-Nada, mas sua mãe já deve estar angustiada em não ver um homem.
Eu ri. Não tinha o que fazer. Só rir.
Já batia onze horas quando ele voltou com os olhos meio inchados. Eu sabia que tinha chorado, mas ele não deu o braço a torcer. Rapidamente aprontei o almoço e nós comemos.
Senti falta dos comentários de papai, pois sempre que almoçávamos juntos, ele contava algo engraçado que leu nos jornais, ou tinha visto na rua. Mas, quieta, continuei, pois não sabia o que havia acontecido. Imaginava que ele sentira falta da mamãe e que esta visita o deixara um pouco agoniado.
O entardecer se aproximava, e antes que Giuseppe me pedisse alguma coisa, resolvi sair.
Quando cheguei ao alto da colina, a “menina das folhas secas” já estava lá. Correndo, pulando, nas folhas e entretendo-se com o barulhinho que estas faziam, quando pisadas. Sempre sozinha, sem nenhum amigo para dividir sua alegria.
         E eu ficava ali. Perguntando-me porque uma menina tão alegre não tinha amigos. Ás vezes eu poderia estar tirando conclusões precipitadas sobre ela, mas eu nunca a tinha visto com ninguém. Nem ao menos com seus pais.
         Voltei a me concentrar no pôr-do-sol que mais uma vez me privilegiava com os raios quentes que batiam em meu rosto. Mas no fundo não parava de pensar no porque daquela “solidão”. O único jeito de descobrir era falando com a menina.
         Levantei e lentamente fui andando em direção a ela, que continuava entretida com as folhas. Quando estava perto, perguntei:
         -Olá! Como é seu nome?
         Ela ficou meio desconfiada, mas respondeu:
         -Sophia.
         -Não precisa ficar com medo. Eu sempre a vejo brincando aqui, mas... Por que você não traz amigos?
         -Eu não tenho amigos. As crianças da minha idade não gostam de brincar aqui, acham uma besteira. Mas você não falou seu nome ainda.
         -Pois é. Meu nome é Helena. Será que você se incomoda em sermos amigas?
         -Não, mas meus pais sempre falam pra eu não falar, nem andar com estranhos.
         -Mas eu não sou estranha. Eu já sei o seu nome e você o meu. E agora o que acha de tomar um sorvete?
         Os olhinhos de Sophia me olhavam com um certo ar de dúvida.
         -É melhor deixarmos pra amanhã. Já está ficando tarde e mamãe deve estar preocupada. -disse ela - Agora eu tenho que ir.
         Eu nem tinha terminado de falar e Sophia já tinha saído correndo. Mas com certeza ela viria brincar com as folhas secas no dia seguinte.
         Chegando em casa, papai encheu-me de perguntas:
         -Onde estava? O que estava fazendo? Com quem estava? Estava preocupado com você, Helena.
         -Calma. Fui só dar uma volta.
         -Não me diga que está namorando! Ai meu Deus! Lá se vai minha única filha, única companheira! Ai, ai...
         -Pai, não diga besteiras. Não estou namorando!
         Deixei-o sozinho suspirando e fui para a cozinha.
          A imagem de Sophia não saía da minha mente, além das perguntas que me atrapalhavam no que eu estava fazendo. Dormir foi difícil, mas acabei pegando no sono.
         Era sempre a mesma rotina de segunda á sábado. Acordar, me arrumar, comprar frutas, legumes e o jornal do papai. Chegar em casa, acordá-lo, preparar o café,...
         Os segundos demoravam a passar e eu não sabia mais o que fazer para passar o tempo. Já tinha lavado os legumes para o jantar, arrumado a casa, lavado as roupas de papai. E não tinha mais nada pra fazer. O jeito era levar Giuseppe para dar uma volta, não muito longa, e fazer passar o tempo.
         Por mais que fosse cansativo subir aquela colina a pé, a minha maior vontade era sair correndo e encontrar logo com Sophia. E lá estava ela. Mas desta vez não estava pulando nas folhas como costumava fazer, estava sentada no banquinho que eu costumava sentar. Achei estranho, mas fui em sua direção e sentei-me ao seu lado.
         -Por que não está brincando hoje?-perguntei.
         -Estava esperando alguém para tomar um sorvete comigo.
         Ela pegou minha mão e nós descemos a colina.
         Eu estava aflita para fazer todas as perguntas, mas se eu fizesse isso, Sophia iria se assustar, então achei melhor levá-la para dar uma volta.
         Esperei a hora certa e comecei:
         -Seus pais ficaram preocupados ontem?
         -Eu não tenho pais. Meu pai morreu na guerra e minha mãe morreu quando eu nasci.
         -Sinto muito. Deve ser doloroso pra você falar disso, desculpe.
         -Tudo bem, eu não ligo. Não os conheci mesmo.
         Nós demos outra volta no parque, então resolvemos voltar para a colina.
         Eu estava assustada com a reação de Sophia, pois apesar de não ter os pais, parecia ser uma menina alegre, que estava sempre brincando, mesmo que sozinha.
         Sentadas no banquinho, observávamos atentamente a cada detalhe do céu, conversando como se já nos conhecêssemos há muito tempo.
         -Você se assustou quando eu contei dos meus pais. – disse ela.
         -Desculpe mais uma vez Sophia. Eu só... Só...
         -Só?
         -Me espantei mais com a naturalidade com que você falou. Eu sei que é difícil não ter pais, eu não tenho mãe.
         -Eu tenho vergonha de dizer que não tenho pais. Só disse pra você, porque é minha amiga.
         -Vergonha?- me assustei de novo.
         -Algumas crianças quando descobrem que eu não tenho pai, nem mãe, ficam rindo da minha cara. E eu não gosto disso.
         -Então você mora com quem?
         -Com minhas tias. Elas me tratam bem apesar de serem um pouco rabugentas.
          -Escute, - disse eu- se as crianças te zombarem por causa do que aconteceu, você não deve ligar. Ainda são muito novos para entender o que a vida tem para lhes dar.
         Sorrindo, Sophia me abraçou.
         Levei-a para casa e lhe disse que voltaria no dia seguinte para vê-la. Ela concordou.
         Já estava indo dormir quando me lembrei da minha conversa com Sophia. Sentei na cama e desabei a chorar, só de pensar em como aquelas crianças não tinham noção do que fizeram.
Não gosto de pensar no fato de não ter um pai.
         Ainda bem que Giuseppe ainda está aqui.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Me perdi numa infinidade de olhos castanhos, gargalhei com os olhos vermelhos, apreciei os olhos verdes e fechei os olhos pra tentar acreditar que tudo o que está acontecendo é real.
Há meses eu não me sentia assim. Bem. Não totalmente satisfeita, mas bem... Me sentindo mais completa, me sentindo mais mulher, me sentindo mais amor.
Me disseram que a partir de agora eu teria mais um motivo pra escrever, mas eu acho que o amor não é pra ser posto em letras, e sim, em olhares e sorrisos.
O engraçado é que, quando alguma música mais "romantiquinha" começa a tocar, você logo se identifica e pensa: "Putz! É exatamente isso que está acontecendo.". E, curiosamente, tudo o que vai acontecendo contigo se torna menos pior. Se torna tudo mais fácil, mais leve.
Acho que o amor não é tudo isso que dizem, simplesmente, por aí... O amor é irredutivelmente apenas o amor. Natural, lindo, leve e monstruoso.
Você ri, chora, briga, confunde, ganha, perde, não entende e, mesmo assim, ainda se sente muito melhor.
Sim, eu estou amando. Acho até meio clichê escrever sobre isso nesse momento, mas como me disseram, a inspiração veio mais fácil.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Medida

Quero agarrar o vento
Sentir a chuva e o calor que sobe depois
Sentir mãos sobre o meu corpo
Lágrimas sobre a minha bochecha
Ver os dias cinzas e os coloridos
E poder desfrutar de cada minuto de cada um deles
Gritar ao mundo a minha pessoa
Mostrar-me com a alma completamente despida
Me abrir para diversidades
E mesmo quando não tenho respostas para o que eu quero
Procurarei me perguntar
O meu destino é ser assim
Não ter vergonha de me amar
Não ter medida pra ser o que eu sou