domingo, 14 de novembro de 2010

Uma parte de Miguel.

            Primeira aula. Ele entrou. Agiu naturalmente, deu suas aulas na mais perfeita calma. Deu-se, então o intervalo. Enquanto todos se dirigiam para a porta eu fingi que procurava alguma coisa em minha mochila e ele fingia que olhava alguns papéis. Levantei, após verificar se todos realmente já tinham saído da sala e fui falar com ele.
            -Tudo bem? – perguntei
            -Tudo. Melhor agora. – ele respondeu sorrindo
            -Pensei que fosse querer esquecer o que aconteceu.
            -Jamais.
            Sorrimos um para o outro e eu saí da sala com a cabeça transbordando em dúvidas.
            Na sexta daquela mesma semana mais uma vez tive que esperar meu pai até mais tarde na escola. Fui até a sala de professores e, como da outra vez, Miguel estava lá. Desta vez chovia muito e eu tinha de esperar. Até que o celular do papai tocou.
            Era de Petrópolis. Meu avô pedindo pro meu pai ir para lá.
            -Filha, vou ter que subir. – disse meu pai – Seu avô está preocupado com algumas coisas e eu vou ajudá-lo. Quanto a você, Miguel, pode passar lá em casa hoje à tarde pra pegar as provas e papéis que separei. Clarice vai estar em casa o dia todo, não vai? Então. Vou direto daqui, filha. Desculpe, mas você vai ter que ir de ônibus.
            Miguel nem se manifestou me dar uma carona e eu também não disse nada. Apenas dei tchau, levantei e fui embora.
            Quando já estava quase no ponto de ônibus, já molhada de chuva, Miguel chegou.
            -Estou sem carro hoje. Vou de ônibus também.
            -Vai no mesmo ônibus? – perguntei
            -Ué! É claro. Vou pra sua casa.
            Eu ri, mas fui o caminho todo sem dar uma palavra.
            Quando chegamos ao prédio já estávamos encharcados. Sugeri que ele subisse para se secar. Quando entramos fui logo tirando o tênis e pedi para que Miguel também tirasse os sapatos e ficasse a vontade. Ele pendurou sua pasta perto da porta e tirou mesmo os sapatos. Fui para o quarto, tirei a roupa e me enrolei numa toalha. Ao chegar à sala, ele me olhou surpreso. Eu disse:
            -Que foi professor? Quer tomar banho?
            -Não, não. Só me secar mesmo, mas pode ir primeiro.
            Eu ri:
            -Não, Miguel. Eu perguntei se quer tomar um banho comigo.

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